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O beijo de 82 - Bom dia. Posso ajudar? - Não está me reconhecendo? - Me desculpe, mas... - O Raul. - Raul? O que morava na minha rua? - Ele mesmo. - Puxa, quanto tempo. Você sumiu. - Pois é. Caí no mundo. - E como vai a vida? - Na mesma. - E então, posso te ajudar? - Eu vim por causa daquela noite em 82. - Que noite? Em 82, você disse? - É. A noite em que o Brasil estreou na Copa. Dois a um na União Soviética. - A Copa? Não me lembro. - Eu sim. Depois do jogo nós fomos até a casa do Pelinho. Lembra do Pelinho? - Vagamente. - Era irmão da Tânia, que era amiga de vocês, meninas. - Da Tânia eu lembro. - Pois foi na casa dela que aconteceu. Estávamos eu, você, ela e o Luizão. Você gostava dele, lembra? - Lembro. - Foi com ele o seu primeiro beijo. Bem na minha frente, na frente de todo mundo. - Foi? Não me lembro assim. - Mas foi. Todo mundo olhava e você chorou. Eu chorei por dentro. - Você? - É. Eu te amava. Tinha quinze anos, mas já amava. Nunca desconfiou? - Estava na cara. Eu gostava um pouco de você, mas não acontecia nada. Você era muito tímido. - Muito. Era um poço de vergonha. Mas aí teve aquela noite em 82. Depois do jogo, teve um carnaval na rua. Fomos todos comemorar. Apareceu um tarol e um bumbo e começou o desfile. O Sérgio, que morava naquela casa bonita, emprestou os instrumentos. Eu te encontrei logo no início, depois foi a vez do Luizão e da Tânia. - E depois? - Quando o bloco seguiu, ficamos só nós quatro. Era junho, mas a noite estava quente. Fomos para a casa da Tânia, que estava sozinha. Não sei o porquê, mas resolvemos brincar de teatro. - Estou me lembrando um pouco disso agora. - Brincamos. Você, que gostava do Luizão, beijou ele para fingir fazer um papel. A Tânia, que também era a fim dele, também topou. - E você? - Não lembra? Podia ter beijado as duas, mas não tive coragem. - Você era mesmo muito tímido. - É. - Pois então? - Eu vim hoje te dar aquele beijo. -Beijo? Eu... Não posso. Sinto muito....estou casada, tenho família. - Eu sei. Mas não é você de hoje que vou beijar. É você em 82. . - Em 82? - É. - É importante assim? - No momento, não há nada mais importante no mundo. - Não sei. - Será um beijo da juventude. A minha, a sua, o beijo que nunca tivemos. - Você não conta para ninguém? - Jamais. - Um só. Pode beijar.............. Foi o que você esperava? - Foi. O beijo perdido. Rá,rá, brincadeira. - Satisfeito, então? - Totalmente. - Bem, eu tenho que voltar aos afazeres. - Eu também tenho que ir. - Você passa sempre aqui perto da empresa? De repente podemos almoçar uma hora dessas. - Eu te ligo. Agora tenho um outro compromisso. Lembra da Sandra? - Não. - Fez o segundo grau comigo e com a Cláudia, tua prima. - Não lembro. Eu conhecia pouco os amigos dela. - Pois é. Vou me encontrar com a Sandra. Teve uma noite, em 85, em que deixei de beijar ela. Foi no baile do colégio, último semestre. Ela me pediu para levá-la em casa e eu amarelei. Agora é enfermeira em um asilo de velhos. # alexandre rodrigues | 16 de novembro Comentários (6) | TrackBack (0) |
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