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ANOS 00 - À ESQUERDA

Gostaria de poder ser otimista. Acredito vagamente que o otimismo gere uma aura de positividade em volta dos seres, o que, num círculo vicioso, atrai coisas boas. Mas, além de o otimismo parecer muito piegas, simplesmente não encontro uma base onde ele possa se sustentar. Fora alguns aspectos pessoais, vejo uma conjuntura bastante precária. Esta década está se encaminhando para o fim sem que nada de legitimamente seu tenha sido gerado. E não falo aqui de novas tecnologias, mas de estéticas, de projetos em várias esferas. Criações originais. Só consigo enxergar a destruição do que existia. E não acredito que seja miopia do meu pessimismo.

Em 2000 estava recém entrando em um curso novo, após tentativas frustradas em outros que pelo menos me mostraram que o mundo era muito mais que o colégio imbecil onde passara toda a vida pregressa. Conheci a maioria dos amigos que hoje formam meu círculo. Engatei também a primeira relação mais estável. Aprendi que cozinhar é essencialmente arrancar a pele das coisas, cortá-las e jogar numa chapa de óleo quente. Ganhei uma edição enorme do Ulisses, com uma dedicatória meiga. Critiquei cruelmente a dedicatória. Arranjei meu primeiro estágio no final daquele ano. No seguinte, comecei a trabalhar em uma grande empresa de comunicação. Tudo se encaminhava muito bem.

Tudo foi tão bem neste começo que é preciso fazer um esforço enorme para lembrar dos detalhes. Não lembro mais das músicas que tocavam no rádio. Lembro de uma colega grávida. Lembro de caminhar através da Independência para casa, o que me garantem que hoje em dia não se pode mais fazer. Lembro de assinar listas de chamada, de pegar o carro ou nas vezes em que me era negada a propriedade da família um ônibus que parecia demorar muito para chegar. Lembro de ligar o rádio e ser informado que um avião se chocara ao maior prédio de Nova York. Lembro de comparecer apenas protocolarmente a reuniões de pauta no jornal. Lembro de estar sentado em uma mesa da Lancheria do Parque com os barulhos de conversa e louça sendo lavada sem ter muita noção do porque estava ali. Lembro de lembrar que já era hora de ir ao Bambu's ou ao Jéckyll ou ao Ossip. Lembro da sensação indefinível de esperar que alguém específico adentrasse o ambiente onde eu estava, seja qual fosse. Lembro de isso acontecer e de ter certeza que havia sido tão difícil para ela quanto para mim. Lembro também de dirigir até a Zona Sul com alguma justificativa forjada, para acabar na beira do rio procurando sentir alguma coisa ao observar o mecânico declínio do sol até que a paisagem virasse tomate.

Quando a pasmaceira da minha existência chegou ao limite coincidiu de minha família já estar se assentando em outra cidade. As amizades já adquiriam o distanciamento natural à maturidade e eu já não sentia mais o mesmo apego de outrora. Parecia urgir uma mudança, uma fuga. Porto Alegre não parecia mais saudável, não indicava ainda ter alguma possibilidade de surpresa positiva. A década chegava na metade e nada de definitivo havia acontecido, nem na minha vida e muito menos na música. A cerveja uruguaia e as bandas sixties que povoavam o cenário da média metrópole não me tentavam. O que vinha das vilas também estava cada vez mais misturado. Não havia saída fora o aeroporto.

A velha capital foi uma experiência renovadora, o mais perto que lembro de ter chegado da felicidade na vida adulta. Baixei muita música no soulseek. Encontrei pessoas no Orkut. Conheci pessoalmente velhos conhecidos, revi outros do passado remoto. Descobri o que teria me tornado se tivesse desde sempre lá permanecido. Tentei reiteradamente algo definitivo por lá, mas não foi. Desisti de comparecer a shows de rock depois de um apreensivo show do Placebo, que me convenceu da inutilidade de pagar pra ver qualquer banda que ainda esteja em atividade. Os Estados Unidos destruíam o Iraque e mesmo assim nenhuma banda boa surgiu. Finalmente, havia desistido.

Depois disso foi o desespero de Lajeado e finalmente a rendição em São Paulo. Esta parte é um pouco mais conhecida e muito melhor lembrada. Os sucessos relativos (conseguir o primeiro emprego de gente e ver o Colorado campeão do mundo, só pra citar dois) podem comprometer o objetivo do texto, então pularei.

Cada frustração envolve uma pequena pancada emocional. Cada coisa que não dá certo é um pequeno corte na tua alma. No autocentramento, fantasio delirantemente que a ausência completa de criatividade na cultura é uma espécie de projeção de minha própria desilusão em todas as outras pessoas. Nunca se pode desprezar que é impossível ver o mundo de outra posição que não a tua própria consciência. Mas eu gostaria que alguém me mostrasse algo de novo que tenha sido feito.

Numa matinê da TNT estava passando estes dias o De volta para o Futuro 2, aquele em que viajam para o futuro. A data a que vão McFlky e o doutor está logo ali: 2015. Erram em absolutamente tudo, no figurino (100% anos 80, mesmo pretendendo futurismo) carros voadores, hologramas no meio da rua. Mas acertam na reciclagem e (TARÃ) no saudosismo: McFly encontra o Biff do futuro no Bar 80's. \praticamente tudo o que se fez nesta década está resumida nesta cena, gravada ainda nos anos 80.

Quanto a mim, que acabei sendo muito mais do que gostaria o centro disso tudo que se escreveu, concluo que o sentimento em relação a esta década adquire contornos finais quando vejo na estante aquela edição enorme do Ulisses, que jamais fui capaz de ler até o final.

24/04/2007 05:01    | Comentários (10)

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