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All night long


Percorria o já por mim muito pisado caminho que separa o Moinhos Shopping da minha casa. Ainda que não seja uma rota perigosa, não se pode dizer que seja segura, especialmente perto da meia-noite, horário em que eu me encontrava na citada trilha.
Tinha acabado de sair do cinema, onde deixei duas horas da minha vida no menos que mediano Procura-se um Amor Que Goste de Cachorros (confesso que me consola um pouco saber que apenas eu, uma senhora com um imenso balde de pipocas, dois casais, um bem jovem e um bem velho, e duas amigas que não paravam de tagarelar sobre tipos de molho tenhamos caído no conto), e estava mesmo disposto a uma agradável caminhada.
E a distância entre o Moinhos e meus aposentos é o ícone perfeito de agradável caminhada para mim, uma vez que a) atravessa lugares bonitos, b) dura entre 12 e 15 minutos e c) passa por ruas pelas quais possuo fortes laços afetivos.
E eu ia, sereno e tranqüilo, observando as obras que desentranharam a Doutor Timóteo para instalação de algum tipo de tubulação. Ia, também, me perguntando o porquê da cidade estar tão parada e quieta. Pouco mais de meia-noite e boa parte dos bares e restaurantes do caminho já mostrava seus cadeados para a rua.
Esse fato, aliás, deixou-me preocupado de leve. Menos movimento é mais perigo.
Cruzei a Cristóvão e entrei no que defino como zona amarela, região que pede um pouco mais de cuidado que a anterior.
Duas quadras depois, avisto um sujeito de aspecto suspeito vindo em minha direção. Grande e desengonçado, caminhava levemente arqueado, trazendo uma perturbadora mão na cintura.
Temi, mas segui em frente.
Ele então começou a falar sozinho, o que me deixou aliviado por um lado e preocupado por outro. Ladrões não costumam murmurar, é verdade, mas psicóticos sim.
Como estávamos bem em frente a um bar, cogitei duas coisas:

1 - parar e simular que estava para entrar ali, afugentando o meliante;
2 - ele deve trabalhar como guardador de carros desse bar.

Tomei a atitude de 1, e verifiquei que 2 estava correto. E mais: ele veio puxar papo comigo:

- Quer entrar aí, véio?
- Pois é, como tá?
- Hoje tá fraquinha a coisa, mas é só três pila. Só o couvert da banda.

Ele tinha um número sem fim de tiques no rosto e no corpo. Parecia estar sendo puxado e repuxado por barbantes. E seguia falando:

- Tu tem que vir aí no sábado. Porque sábado... (sabe o tipo de pessoa que para enfatizar alguma coisa diz a frase só até um pedaço e espera tu completar?)
- A coisa ferve?
- Bah!

Nesse momento, desesperado para seguir meu caminho para casa o mais rápido possível, lancei mão do bom e velho artifício da identificação. Comecei a usar gírias que, de acordo com minha catalogação mental, pertenciam ao mesmo grupo das dele:

- Certo. Bom, vou ali buscar minha MINA e já volto, então.
- Ah, pra vir de casal hoje tá o canal. Uma da manhã vai tocar a banda do Garcia.

Foi por pouco, muito pouco, que não cometi o erro de pedir mais informações sobre a banda do Garcia. Sabiamente me calei.

- Legal.
- Meu, sábado aqui tinha quatro mulher pra cada homem. A gente fez a contagem na portaria. Cada um que entrava a gente anotava. Mulher. Homem. Mulher, mulher, mulher. Quatro pra cada. As mina tavam se jogando.
- Nossa.
- Mas vem aí, vem aí.
- Vou dar uma BANDA ali e já volto.

E comecei a andar para que ele parasse de falar, o que ainda deve ter demorado uns oito segundos para acontecer.

Segui até em casa, sem problemas (no caminho ainda presenciei uma senhora perguntando a dois rapazes “que tipo de moça vocês gostam” na porta de uma casa que eu já suspeitava tratar-se de um local de meretrício). Cheguei, tomei banho, assisti o Rogério Skylab no Jô e dormi. Precisamente na hora em que a banda do Garcia devia estar subindo no palco.