Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


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em um clima meio auto-ajuda

Volta e meia algum primo ou conhecido em vias de escolher alguma faculdade no formulário de inscrição no vestibular pergunta qual profissão é melhor. Ficam atemorizados com aquelas dezenas de possibilidades, como se não pudessem mais tarde mudar de rumo. Jovens sempre acham que tudo é definitivo. Mas os primeiros anos na universidade e no mercado de trabalho, quer dizer, na vida adulta, logo mostram que não apenas muito pouca coisa é definitiva, como a maior parte da existência depende do mais puro acaso.

A melhor resposta às perguntas da gurizada é "a que achar melhor". Com uma ressalva: é preciso pedir que decidam pensando na rotina profissional, não no curso universitário. "Tem saco para trabalhar dez horas por dia, às vezes virar noites sem pagamento de horas extras, agüentar chefes malucos e ganhar uma merreca? OK, então pode ser jornalista." Está certo que o mundo não segue regras, mas é preciso se manter conectado à realidade, por mais caótica que seja.

Há umas poucas profissões que podem ser descartadas de cara, já que não prometem muito futuro até onde a vista alcança, como artes cênicas, engenharia de minas ou licenciaturas. Medicina, direito e administração seguem sempre tendo muito mais possibilidades de enriquecimento, ou ao menos de vida confortável. Ainda assim, entretanto, não é certo e muita gente pode se dar melhor em alguma faculdade aparentemente inútil, como ciências atuariais ou jornalismo. É a parte boa da abissal aleatoriedade da existência: nunca se sabe o que pode acontecer.

Não me imagino hoje trabalhando em uma redação. Parece evidente que ter cursado direito seria uma opção de carreira muito melhor. Até gosto do assunto e a esta altura poderia ser juiz ou promotor, livre de maiores preocupações financeiras. Entrei porém no curso de farmácia, porque minha família tem uma e parecia útil, depois pedi transferência para o jornalismo sabe-se lá por qual motivo. Um dia simplesmente vi cartazes avisando das vagas para transferência interna na UFRGS, descobri que jornalismo oferecia três, preenchi a papelada na hora mesmo e nunca mais apareci na faculdade de farmácia. Vai entender.

Graças a essa sucessão de aparentes erros, no entanto, aconteceram a maior parte das coisas boas em minha vida. Conheci muitos bons amigos, mulheres fascinantes, participei de festas indescritíveis, aprendi a escrever direito, fiz viagens, ganhei bolsas de estudos, aprendi línguas e ultimamente descobri o prazer da vida acadêmica e do trabalho editorial. Desde criança amei livros e pareço estar em eterna sala de aula, sempre dando um jeito de exibir o pouco que conheço a qualquer um que tenha a infelicidade de se tornar minha platéia. Até onde a vista alcança, quero ser professor e seguir trabalhando com livros.

Se tivesse cursado direito, estaria fazendo o mesmo? Duvido. Estaria, ao contrário de agora, infeliz? Também duvido. Os acasos teriam me levado a descobrir outros prazeres. Talvez até maiores. Talvez menores. Impossível saber. Quiçá minha verdadeira vocação fosse ser pedreiro? Tanto faz. O importante é que sempre existem possibilidades ótimas, seja qual for o caminho, mesmo quando parece errado. Tudo que acontece é bom.

21 de maio de 2006, 16:49 | Comentários (21)



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