Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


o padre maluco e o utilitarismo

Finalmente alguém publicou uma notícia a respeito dos custos envolvidos na busca ao padre que desapareceu durante um vôo de balões no litoral catarinense. Até ontem, R$ 564 mil já haviam sido gastos pelas equipes de resgate mobilizadas, a maior parte na operação de navios da marinha.

A informação satisfaz as muitas pessoas que andam indignadas com o fato de o Estado usar recursos do contribuinte para tentar encontrar um doido varrido que resolveu imitar uma menção honrosa do Prêmio Darwin, na preparação para tanto foi expulso do curso de vôo livre e, como mostram as ligações do próprio padre durante o vôo, não se deu nem ao trabalho de aprender a usar o GPS, um equipamento essencial de segurança, antes de partir -- e partir num dia de tempo ruim. Aparentemente, Deus não gosta de gente idiota tanto quanto o processo evolutivo.

Apesar de o clérigo ter praticamente cometido suicídio com essa aventura, o Estado não tinha alternativa senão tentar encontrá-lo. Negar-se a investir recursos em buscas com o argumento da imbecilidade do desaparecido seria negar-se a cumprir o papel de protetor da população, principal motivo para a existência de um Estado em primeiro lugar. Em segundo lugar, seria dar licença ao povo para agir conforme uma visão utilitarista da vida humana. É um perigo.

Se um padre alienado não vale R$ 564 mil, na opinião do Estado, quanto valeria uma criança com síndrome de down? E um criminoso? Em alguns momentos históricos a vida humana foi avaliada conforme sua utilidade social. Os escravos romanos eram obrigados a minerar em condições desumanas, porque assim que morriam podiam ser substituídos por novos prisioneiros de guerra. Embora muito úteis fossem os escravos, ao menos no caso do Brasil a oferta era grande o suficiente para fazer com que não valesse muito a pena manter vivo um criador de casos. Durante a revolução industrial, condenados eram enviados aos trabalhos forçados, onde supostamente compensariam o custo de sua manutenção. A visão utilitarista da vida humana foi levada ao paroxismo na Segunda Guerra, quando os nazistas montaram fábricas de processamento de judeus, ciganos, comunistas, homossexuais e outros degenerados, dos quais eram retirados todos os recursos (roupas, jóias, óculos, cabelos -- que serviam para fazer tecidos --, a força de trabalho) e os resíduos (isto é, as pessoas) eram incinerados.

Abrir uma brecha ao utilitarismo dizendo que o padre não deve ser resgatado porque realizou uma aventura temerária é dar mais um passo a um futuro que foi bem imaginado por George Lucas em seu primeiro filme, THX 1138. Mostra uma sociedade distópica, em que a emoção foi banida e o valor maior se tornou a eficiência. O herói do filme acaba se apaixonando por uma moça, ambos são presos, ele resolve fugir. As máquinas que organizam a sociedade iniciam uma perseguição, mas quando estão quase o alcançando, desistem. Motivo: os recursos usados para a caçada ultrapassaram o valor de THX 1138 para o Estado.

26 de abril de 2008, 11:38 | Comentários (21)

"o segredo" é estelionato pseudo-científico

Essa tal de "lei da atração", consubstanciada hoje em dia no livro e no filme O $egredo, é uma enorme picaretagem para tirar dinheiro de otários. Infelizmente, nenhum dos incautos vai saber disso através da mídia, ao menos aqui no Rio Grande do Sul, porque a RBS é uma das empresas que apóiam um seminário sobre o livro. Nem provavelmente qualquer outro veículo brasileiro vá expor essa auto-ajuda travestida de ciência, porque auto-ajuda dá montes de audiência, o que resulta em mais lucros com publicidade. E assim, todo mundo fica satisfeito, né?

Felizmente, existem blogueiros que se dão o trabalho de fazer uma apuração mínima, coisa de 20 minutos, para desmascarar a aura científica disso tudo. Na verdade, esse post partiu de uma curiosidade incontrolável de saber quais eram os pesquisadores sérios emprestando seu nome a um estelionato.

Assim como aquela outra picaretagem chamada Quem Somos Nós, a proposta de Rhonda Byrne pretensamente se baseia nas teorias da física quântica. Muito bem. No dia em que Stephen Hawkings em pessoa der seu aval à lei da atração, será possível começar a pensar em acreditar nela. Até agora, os únicos fí$ico$ quântico$ que deram algum depoimento em favor dessa bobagem foram John Hagelin e Fred Alan Wolf.

Nem é preciso desacreditar o segundo, basta o caro leitor clicar no link e ver por si mesmo o site do homem. Já diz tudo. Hagelin, por outro lado, até parece um sujeito sério, mas não foi possível encontrar menções a qualquer contribuição dele à física quântica em seu próprio currículo, nem em lugar nenhum da Web. Isso que Hagelin trabalhou no CERN. Aparentemente, ele se deu conta de que distorcer os achados de Einstein, Bohr, Heinsenberg e outros dá mais dinheiro do que fazer átomos colidirem e analisar os resultados em equações matemáticas complicadas.

Nem vale a pena averiguar o currículo dos filó$ofo$ e do metafí$ico que emprestam seus argumentos a Rhonda Byrne -- e menos ainda dos especialistas em marketing e administração. Eles podem acreditar no que quiserem. Desde que seu sistema teórico seja coerente e sem contradições, não precisa nem ter qualquer correspondência com a realidade.

Pior de tudo, toda essa idéia de lei da atração tem mais de 100 anos. O autor original -- que, diga-se em favor de Byrne, recebe o devido crédito -- é um tal Wallace Wattles, filó$ofo, que escreveu A Ciência Para Ficar Rico. Trecho em que ele explica o princípio de sua teoria, na página 15:

O pensamento é a única força que pode produzir riquezas tangíveis, originárias da substância amorfa. A matéria de que todas as coisas são feitas é uma substância que pensa, e pensando nas formas esta substância as produz.

Na página 18, ele apresenta o leitor o método de pesquisa usado para chegar a essa conclusão bombástica:

Racionalizando sobre os fenômenos da forma e do pensamento, eu cheguei a uma substância original pensante, e raciocinando a partir desta substância pensante, cheguei ao poder das pessoas de causar a formação das coisas que pensa. E pela experiência, eu encontrei o raciocínio verdadeiro. Esta é a minha prova mais forte.

Difícil entender como Wattles não ganhou um Nobel de física com a proposição de que a lei da atração existe porque ele refletiu sobre o mundo e concluiu pela sua existência. Se bem que até faz sentido: se basta pensar em algo para que esse algo passe a existir, o simples fato de Wattles imaginar a lei da atração causou sua existência. E pensar que o pessoal perde o maior tempo tentando entender Kant nos departamentos de filosofia.

De qualquer modo, não é impossível que essa bobajada até melhore a vida das pessoas. Rhonda Byrne provavelmente acredita mesmo que melhorou de uma depressão por conta dessas idéias. Até aí, a Igreja Universal já tirou muita gente das drogas e da bebida, por mais que Edir Macedo só esteja interessado no dízimo. O duro é ver empresas de jornalismo, cujo dever seria desmascarar essas fraudes, apoiando um evento estelionatário no lugar de prestar o serviço público que diz ser seu objetivo maior.

16 de novembro de 2007, 11:23 | Comentários (18)

primeiro "cevas e blogs" de porto alegre

O Bender está organizando o primeiro encontro de blogueiros Cevas e Blogs da capital gaúcha. Como gaúcho é melhor em tudo, certamente se tornará uma referência para toda a Terra esse encontro. Imperdível.

Será na terça-feira que vem, a partir das 18:00, no bar Cerilo, que fica na Venâncio Aires, 1085, esquina com Jacinto Gomes. No post original sobre o assunto tem um mapa. Devo aparecer por lá depois das 19:30.

9 de novembro de 2007, 12:17 | Comentários (11)

a longevidade é superestimada

Ultimamente as "reportagens" sobre novos métodos para evitar o envelhecimento e aumentar a expectativa de vida têm me incomodado mais do que de costume. Há alguns dias o pesquisador Richard Watson publicou uma linha do tempo da extinção de várias coisas. Segundo ele, após 2050 a humanidade se livrará da feiúra e da morte. Não que Watson deva ser levado muito a sério, porque pelo jeito é apenas um futurólogo. O fato de ele prometer o fim da morte, por outro lado, é sintoma de algo maior e mais profundo.

A longevidade se tornou um valor em si mesma. Todos querem viver 100, 120, 200 anos, como se isso fosse um objetivo inquestionável, o sentido da existência humana como um todo. Pior ainda, querem se manter jovens até idades avançadas. E dá-lhe verbas de pesquisa e desenvolvimento de novas drogas e métodos para evitar o envelhecimento, dá-lhe espaço na mídia para divulgar os achados nessa área, dá-lhe gente fazendo sacrifícios enormes para atingir a imortalidade.

Alguns métodos são um pouco mais doidos do que outros. O pessoal do transhumanismo, capitaneado por Ray Kurzweil e outros, sonha com o dia em que seres humanos descarregarão suas mentes em redes eletrônicas ou cérebros robóticos, deixando para trás esse corpo fedido e decadente. Um grupo um pouco mais sensato e realista advoga a restrição calórica como forma de acrescentar algumas décadas à vida humana. E há ainda as pessoas que se contentam em usar cosméticos caríssimos, fazer exercícios e seguir uma alimentação adequada do ponto de vista clínico.

O Fantástico de domingo mostrou uma reportagem sobre uma nova escala de risco cardíaco. A escala de Framingham é embasada em dados sólidos, coletados ao longo de décadas. Deve dar mesmo uma boa idéia do risco de se ter uma doença coronariana. O problema é que mostraram uma mulher que, depois de perder trocentos quilos e passar a adotar uma alimentação supersaudável, levou um puxão de orelhas do médico por fumar quatro cigarros por dia. Odeio cigarros, sei que fazem mal, mas poxa! A mulher já mudou completamente a vida e isso não satisfaz à medicina. Depois de tudo, nem um pequeno luxo ela pode se dar. Se largar os quatro cigarros diários vai ganhar o quê? Uns dois ou três anos a mais de vida? É por isso que ninguém agüenta seguir ordens médicas.

O mais estranho é que ninguém mais parece se admirar com essa negação do presente em nome da eterna juventude. Antes de pensar em viver além dos cem anos, as pessoas deveriam estar preocupadas em arranjar algo que preste para fazer hoje, amanhã, semana que vem. Parece que nunca param e refletem sobre o que seria viver mil anos batendo ponto na mesma empresa todo dia, comendo no mesmo restaurante todo dia, vendo os mesmos Matusaléns todo dia. Ninguém nunca pensa nas conseqüências funestas da longevidade.

Nada contra viver até os cem anos com toda saúde e disposição possíveis. O glamour de morrer jovem e ser um belo cadáver é tão condenável quando o encanto da imortalidade. Só não parece valer muito a pena passar a vida inteira comendo tofu e suando na academia para chegar lá. E isso se não morrer aos 64 anos, quando um cachorro pastor alemão saltar de uma cobertura em Capão da Canoa e atingi-lo na cabeça, quebrando seu pescoço (fato real, acreditem), tornando tudo uma tortura inútil.

23 de outubro de 2007, 14:14 | Comentários (16)

um homem de verdade a menos

Em toda essa história da chacina na Virginia Tech, o que realmente chama a atenção é a atitude do professor Liviu Librescu, que segurou a porta enquanto seus alunos fugiam pelas janelas e acabou morto. Librescu era um judeu de origem romena, sobrevivente do holocausto. Difícil saber o que se passou em sua cabeça, se é que algo passou. O fato é que achou mais importante salvar seus alunos do que garantir a própria segurança. Coisa difícil de se ver hoje em dia.

É simbólico que um dos poucos a se preocupar com os outros durante o tiroteio seja uma pessoa que teria todos os motivos para preservar sua vida ao máximo — afinal, não se tem sempre a sorte de passar incólume por uma situação de violência extrema duas vezes. Dois outros alunos ajudaram a segurar portas, ambos americanos ao que parece, mas nenhum deles foi ferido. Librescu se tornou o herói da história e isso é bom, porque em sua atitude está parte da solução para esse tipo de maluquice. O medo tende fazer com que as pessoas se preocupem consigo mesmas. É justo, mas também existe a possibilidade de isso aumentar ainda mais a distância entre as pessoas. E isolamento era justamente um dos problemas de Cho, o atirador.

É claro que Cho já era meio doido antes, mas certamente não ajudou o fato de sua professora separá-lo dos outros em atividades de aula, porque ele era considerado esquisito. Sintomática do nosso tempo a pergunta da apresentadora do Bom Dia Brasil de hoje ao correspondente Rodrigo Alvarez: "Rodrigo, sabemos que existem muitas pessoas desajustadas nas universidades americanas, o que as pessoas estão fazendo para se proteger?". Nossa sociedade vê os desajustados como ameaças, anomalias a separar do resto e, de preferência, eliminar. Até há pouco, a idéia era justamente a contrária. Todo o iluminismo se baseava na idéia de integrar melhor à sociedade os desajustados — o que também teve seus efeitos nefastos, como o imperialismo britânico, mas isso é outro papo. Não parece que isolar ainda mais as pessoas problemáticas vá impedir novas chacinas.

A resposta está em Librescu: é preciso voltar a nos preocuparmos um pouco mais com o próximo e menos com nós mesmos.

19 de abril de 2007, 1:42 | Comentários (20)

cerca de 190 milhões de pessoas arrastam criança por 7km

O mundo real impôs uma breve pausa na redação de minha dissertação para comentar a notícia de que uma criança foi arrastada por um carro por 7 quilômetros no Rio de Janeiro. Dizem os caros colegas repórteres que três, talvez quatro bandidos foram os responsáveis. Manipulação! Estão querendo nos esconder a verdade. E a verdade é que foram 188.096.112 pessoas a arrastar a pobre criança.

São os mesmos 190 milhões de pessoas que deixam a educação chegar ao ponto de as crianças não acertarem nem 40% de uma prova de múltipla escolha. Os mesmos 190 milhões que comemoram quando a Polícia Militar humilha gente pobre, como se todos os pobres fossem bandidos. Que festejam a tomada das favelas cariocas por milícias de policiais criminosos. Que, quanto mais dinheiro têm, mais sonegam impostos. Que acham o máximo treinar artes marciais para brigar na night, as mesmas que colocam a beleza exterior à frente do desenvolvimento do espírito. As mesmas que elegem um bando de gente inútil. Os mesmos 190 milhões de pessoas que ignoram uma pergunta simples: por que os seres humanos não são intrinsecamente maus em outros lugares?

Felizmente, algumas pessoas não se deixam enganar e vão à raiz do problema. A plebe anda ameaçando os pais dos acusados, os intelectuais propõem uma eugenia pós-parto sob forma de diminuição da maioridade penal e as pessoas de bem prometem mais um protesto contra a violência. É aliviante perceber uma divisão do trabalho tão bem organizada entre os diferentes setores da sociedade para resolver as mazelas do país.

9 de fevereiro de 2007, 23:44 | Comentários (84)

devia estar escrevendo minha dissertação

Enquanto inflo meu saco explicando numa manhã de sábado como pretendo fazer uma análise de conteúdo do Wikinews e do Kuro5hin, na laje do prédio em frente duas amigas de meia-idade fazem um churrasco e tomam banho de sol sob 35ºC. Fora do horário definido pelos dermatologistas. Espero que estejam usando filtro solar.

Não consigo deixar de simpatizar com elas, mesmo que não sejam as ninfetas voluptuosas que costumam animar a vista da minha janela nessas tardes de verão. Nenhuma das duas tem encanto algum, embora também não sejam balzaquianas feias. O interessante é o perfil das duas que essa cena desenha em minha cabeça.

Ver duas mulheres fazendo algo em geral restrito a homens é legal. Não que as fêmeas não tenham capacidade para isso — uma amiga faz um dos melhores churrascos que já comi —, mas em geral elas não se interessam muito por assar carne. De fato, estão apenas com um espeto ali. Há algo de existencialista em se acender um fogo para fazer só um espeto. É um trabalho enorme e desnecessário. Agora terminou de assar e elas foram comer em outro lugar.

Posso imaginá-las de manhã em casa, meio de saco cheio por não terem companheiros. "Foda-se, vamos fazer um churrasco na laje!" Já passaram por muita coisa para acreditar que arranjar um namorado e outras aspirações femininas vá melhorar suas vidas. Sabem que bom mesmo é dividir o pequeno prazer de assar uma carne na laje com o grande prazer da amizade. Tomarão cervejas para afastar o calor, darão risadas e descansarão assistindo TV.

Passado esse breve interlúdio filosófico, voltemos à ABNT.

16 de dezembro de 2006, 13:54 | Comentários (15)

baudrillard tem razão

A Hewlett-Packard está vendendo câmeras digitais com um filtro de emagrecimento embutido. Você tira a foto, aplica o filtro e ajusta o quanto quer parecer mais magro. Nada que o Photoshop não pudesse fazer melhor, mas ainda assim com implicações, digamos, ontológicas. Ninguém mais precisa ser um especialista em algum programa para modificar a própria imagem. É mais ou menos o que os bloggers fizeram pela publicação na Web.

Esse filtro é como uma materialização da insatisfação das pessoas consigo mesmas na sociedade de consumo. Como a longo prazo ninguém consegue impedir a decadência do organismo, apela-se para o simulacro. Se antes tirava-se fotos para no futuro podermos lembrar como nós e nossos entes queridos éramos, agora cria-se tecnologicamente um passado um pouco mais glamouroso. A fotografia tinha como função principal auxiliar nossa memória, que tem uma péssima tendência de se modificar ao longo do tempo e se adequar a nossas construções psicológicas atuais. Com a vulgarização dos sistemas de manipulação de imagem, passa-se a usar a fotografia para construir uma memória falsa no futuro.

Se não podemos ser quem queremos agora, podemos sê-lo artificialmente daqui a algumas décadas.

Dica do Parada.

20 de setembro de 2006, 14:49 | Comentários (8)

gênio da raça
A minha filosofia não consiste em procurar a harmonia dos contrários, mas, ao contrário, em ressaltar as contradições da natureza, para que sejam, pelo menos, controladas.

As forças contrárias se atraem em virtude de uma lei que não me é dado evitar e pela qual não sou absolutamente responsável. Sei que do encontro de uma carga positiva e de outra negativa, resulta a faísca. Não me sendo possível impedir a faísca, procuro desempenhar o papel de pára-raios.

Este texto foi escrito em 1946, mas continua muito atual. De fato, lembra o sujeito de que as pessoas parecem não aprender nada, por mais que se repitam as coisas ao longo dos séculos. Também o faz se perguntar onde andarão os gênios do quilate do Barão de Itararé.

16 de setembro de 2006, 10:44 | Comentários (4)

aforismo

Quem ajuda demais atrapalha em dobro.

Nada supera em chatice as pessoas que querem lhe fazer o bem a todo custo. Acabam atrapalhando mais do que quem lhe opõe empecilhos, porque com estes ao menos se pode ficar irritado. Se você fica brabo com alguém que tenta lhe ajudar, ainda corre o risco de passar por ingrato.

7 de setembro de 2006, 10:25 | Comentários (10)

se amas teu filho, não lhe poupes a vara
The problem might be, for example, that people have come to believe that the satisfaction of choice, no matter how ill-informed, whimsical or deleterious, however childish or child-like, is the whole meaning of existence, at all the ages of man, from the very moment of birth onwards. Clearly, this has a connection with the notion of consumer choice: it is the wrongful extension of a principle that, in the right context, is obviously an excellent one.

Theodore Dalrymple destrincha as razões mais óbvias para o surto de obesidade infantil em um artigo na New English Review. É assunto marginal no texto, que trata na verdade do preconceito politicamente correto em artigos científicos, mas levanta uma das questões mais irritantes hoje em dia: a incapacidade de assumir responsabilidades. No caso, a responsabilidade de educar os filhos, aspecto que preocupou o Pedro Doria.

Como os adultos esperam educar os filhos se eles mesmos agem como pivetes mimados, sem a menor habilidade em lidar com frustrações? Os marqueteiros tiveram sucesso em convencer as pessoas de que a vida DEVE ser só prazer. Pais criados sob o rigor de outro ambiente cultural não querem que seus filhos passem pelo mesmo "sofrimento" de ter suas vontades negadas. Por causa da crença no prazer constante, não conseguem ver o quanto as frustrações formam o caráter de um ser humano. Como criança que levou umas boas palmadas toda vez que mereceu, diria até que, se tivesse de escolher entre pais superrigorosos e pais idiotas, preferiria os primeiros. Poderia crescer com montes de neuroses, mas é mais fácil se livrar delas do que passar a tolerar a frustração depois de ter se tornado um narcisista. A queda é alta quando se entra em contato com a realidade.

Responsabilidade é tomar atitudes dolorosas no presente, para atingir um bem maior no futuro. Não tenho filhos, mas imagino o quanto é doloroso negar algo a eles. Ter de ouvir deles que você é um fascista, um chato de galochas, que não os ama o suficiente, se não quer dar seja lá o que queiram. Convém não esmorecer nesse momento. Se ser pai é preparar para a vida adulta, mostrar que não se pode ter sempre o que se quer talvez seja a coisa mais importante. Por outro lado, limites costumam incentivar a criatividade. Nenhum pai sensato acha que os filhos se conformam sempre com o "não". É claro que vão tentar driblar de alguma forma aquele limite. Quando conseguem, aí, sim, talvez seja o caso de fechar um olho, deixar estar e admirar em silêncio a inteligência do garoto.

E, em geral, quando a criança sai pela tangente e faz o que não deveria, logo descobre que os pais tinham bons motivos para negar alguma coisa.

17 de julho de 2006, 10:10 | Comentários (32)

nada mais solitário que a multidão

O Parada comenta notícia do Washington Post, dando conta de que o número de norte-americanos solitários dobrou nos últimos vinte anos. Estas pessoas reclamam de não ter com quem falar de seus problemas.

Os comentários descambaram para uma discussão sobre psicanálise, quando o Parada lembrou que muita gente paga profissionais para este tipo de desabafo. Os outros se mostraram mais do que céticos em relação à utilidade da terapia. Uns propuseram esporte como forma de descarregar as frustrações — o que aliás funciona muito bem. No entanto, é complicada mesmo essa questão da falta de interlocutores.

O ser humano precisa se assegurar de alguma forma que vê o mundo da maneira apropriada. Nada pior do que se sentir pensando em alguma coisa sozinho. Achar que só você tem medo de não saber criar os filhos direito, por exemplo, ou que, realmente, não faz muito sentido se matar de trabalhar cinco ou seis dias por semana quando a existência é tão curta. É bom saber que não se está ficando maluco, ou distante da realidade. Serve também para aprender como se vive em sociedade.

O patético é que em geral as pessoas têm receio de desabafar sobre estas mesmas questões com os amigos ou a família, com medo de ser julgadas por suas opiniões ou "idéias bobas". Temos necessidade de resolver dúvidas existenciais, mas não temos coragem. Como se não fosse uma dificuldade compartilhada por todos. Aí o sujeito vai lá e paga alguém para ouvi-lo de um ponto de vista neutro. Ou arranja uma religião que ofereça um manual para tudo isso, explicando o que se pode e o que não se pode fazer. Tanto faz.

Diz-se por aí que dos pacientes psicanalisados, um terço melhora, um terço piora e o outro fica na mesma. Provavelmente não é verdade, mas também não é impossível. Em todo caso, faz sentido. Na vida, as pessoas melhoram, pioram ou ficam na mesma. Psicanálise não pode mudar isso. No máximo, permite ao paciente aceitar isso. Ou, como gosto de responder quando me perguntam se me ajudou: "olha, continuo fazendo as mesmas cagadas, mas agora ao menos eu sei o porquê".

25 de junho de 2006, 11:29 | Comentários (6)

por que eu deveria me levantar pela manhã?

FAQ sobre o sentido da vida.

E não, não se trata de uma paródia. Ao menos não de uma paródia voluntária.

19 de junho de 2006, 21:03 | Comentários (2)

em vez de estudar, fica pensando bobagem

Solidão é se levantar para bater palmas e ninguém na platéia acompanhar.

19 de junho de 2006, 10:28 | Comentários (6)

em um clima meio auto-ajuda

Volta e meia algum primo ou conhecido em vias de escolher alguma faculdade no formulário de inscrição no vestibular pergunta qual profissão é melhor. Ficam atemorizados com aquelas dezenas de possibilidades, como se não pudessem mais tarde mudar de rumo. Jovens sempre acham que tudo é definitivo. Mas os primeiros anos na universidade e no mercado de trabalho, quer dizer, na vida adulta, logo mostram que não apenas muito pouca coisa é definitiva, como a maior parte da existência depende do mais puro acaso.

A melhor resposta às perguntas da gurizada é "a que achar melhor". Com uma ressalva: é preciso pedir que decidam pensando na rotina profissional, não no curso universitário. "Tem saco para trabalhar dez horas por dia, às vezes virar noites sem pagamento de horas extras, agüentar chefes malucos e ganhar uma merreca? OK, então pode ser jornalista." Está certo que o mundo não segue regras, mas é preciso se manter conectado à realidade, por mais caótica que seja.

Há umas poucas profissões que podem ser descartadas de cara, já que não prometem muito futuro até onde a vista alcança, como artes cênicas, engenharia de minas ou licenciaturas. Medicina, direito e administração seguem sempre tendo muito mais possibilidades de enriquecimento, ou ao menos de vida confortável. Ainda assim, entretanto, não é certo e muita gente pode se dar melhor em alguma faculdade aparentemente inútil, como ciências atuariais ou jornalismo. É a parte boa da abissal aleatoriedade da existência: nunca se sabe o que pode acontecer.

Não me imagino hoje trabalhando em uma redação. Parece evidente que ter cursado direito seria uma opção de carreira muito melhor. Até gosto do assunto e a esta altura poderia ser juiz ou promotor, livre de maiores preocupações financeiras. Entrei porém no curso de farmácia, porque minha família tem uma e parecia útil, depois pedi transferência para o jornalismo sabe-se lá por qual motivo. Um dia simplesmente vi cartazes avisando das vagas para transferência interna na UFRGS, descobri que jornalismo oferecia três, preenchi a papelada na hora mesmo e nunca mais apareci na faculdade de farmácia. Vai entender.

Graças a essa sucessão de aparentes erros, no entanto, aconteceram a maior parte das coisas boas em minha vida. Conheci muitos bons amigos, mulheres fascinantes, participei de festas indescritíveis, aprendi a escrever direito, fiz viagens, ganhei bolsas de estudos, aprendi línguas e ultimamente descobri o prazer da vida acadêmica e do trabalho editorial. Desde criança amei livros e pareço estar em eterna sala de aula, sempre dando um jeito de exibir o pouco que conheço a qualquer um que tenha a infelicidade de se tornar minha platéia. Até onde a vista alcança, quero ser professor e seguir trabalhando com livros.

Se tivesse cursado direito, estaria fazendo o mesmo? Duvido. Estaria, ao contrário de agora, infeliz? Também duvido. Os acasos teriam me levado a descobrir outros prazeres. Talvez até maiores. Talvez menores. Impossível saber. Quiçá minha verdadeira vocação fosse ser pedreiro? Tanto faz. O importante é que sempre existem possibilidades ótimas, seja qual for o caminho, mesmo quando parece errado. Tudo que acontece é bom.

21 de maio de 2006, 16:49 | Comentários (21)

freud explica

Interessante como o caráter de uma cidade se expressa até mesmo nos criminosos. Sempre pareceu que algo como a atual guerra civil em São Paulo aconteceria primeiro no Rio de Janeiro. Agora, no entanto, é evidente que só a organização e profissionalismo paulistas poderiam gerar um plano com essa vastidão, capaz de fazer parar uma das maiores metrópoles do mundo. Os bandidos cariocas são maloqueiros e malemolentes demais para uma ação coordenada, preferindo explosões ocasionais e esparsas de violência, sem se preocupar estabelecer uma hierarquia bem pensada. Paulistanos são mafiosos, cariocas são apenas malandros.

Talvez pela proximidade, é difícil definir uma personalidade para a bandidagem gaúcha. Sugestões?

16 de maio de 2006, 2:03 | Comentários (91)

coisas em que você nunca pensou

Por que existem tantas simpatias para encontrar o amor, fazer com que o ser amado volte em três dias, casar, mas não existe nenhuma para aniquilar alguém da memória?

13 de maio de 2006, 22:51 | Comentários (36)

coisas em que você nunca pensou

Em qualquer supermercado existem lâminas de barbear para vender, daquelas antigas, retangulares, que as pessoas usam para se matar — ou para bater cocaína antes de cheirar. Será que ainda existem tantos idosos que usam este tipo de aparelho, ou essas lâminas são mais o menos como o Colomy?

22 de março de 2006, 19:45 | Comentários (9)

coisas em que você nunca pensou

É relevante que Spencer tenha escolhido survival of the fittest como resumo da teoria evolucionária de Darwin. Fittest é bem diferente de strongest, ao contrário da interpretação que a maioria das pessoas faz. Fit em inglês significa "encaixar", ou seja, adaptar-se a um espaço ou ambiente. A frase de Spencer tem então o sentido de "sobrevivênvia do mais apto", ou aquele que melhor se adapta ao ambiente, não de "sobrevivência do mais forte".

9 de março de 2006, 19:39 | Comentários (4)


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