Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


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centenário do cardosonline

Na noite de ontem, os felizardos que se registraram no www.inventamosainternet.com receberam a histórica edição de 100 anos do Cardosonline. Há exatamente dez anos, era publicada a primeira edição do fanzine por e-mail do qual participei junto com o André "Cardoso" Czarnobai, os Daniéis Galera e Pellizzari, o Hermano Freitas, os Guilhermes Pilla e Caon e a Clarah Averbuck. Como na Internet cada ano vale por dez, estamos comemorando o centenário.

Abaixo, a minha COLuna, para quem prefere ler aqui.

A VERDADEIRA MAIONESE

--Marcelo Träsel

Consultado a respeito de sua COLaboração nesta edição de centenário do Cardosonline, o COLunista Marcelo Träsel expressou a preferência por se manter em silêncio na varanda de casa, esperando as hordas que vêm destruir a cultura e a civilização com a espingarda calibre 12 herdada do avô e preparada para "proteger minha família, a tradição e a propriedade". O antigo co-fundador da publicação acrescentou que "teria mais prazer se vermes comessem as minhas bolas ainda em vida" do que tendo um texto seu publicado novamente junto aos "daqueles pederastas drogados filhinhos de papai". Assim, optamos por convidar o eminente crítico prof. dr. Buarque para realizar uma análise de um texto da obra de Marcelo Träsel no Cardosonline.

-- Os editores

AGORA ERA FATAL

Uma coisa é você andar por aí procurando nada e achar ouro. Antes de voltar, eu sei, precisamos provar para nós mesmos o sentido de tudo. E andar. O Cardosonline foi um veículo de suma importância no caldo de cultura primordial da Internet brasileira e, quiçá, mundial. O veículo de fato inaugurava em outubro de 1998 um novo formato, o e-zine, mailzine ou fanzine em suporte eletrônico. Era um caleidoscópio, um espelho quebrado de egotrips e opiniões motorizadas pela testosterona juvenil - sim, temos conhecimento da presença de uma colunista, ou como prefeririam os autores do dito periódico, COLunistas, a hoje escritora e mãe Clarah Averbuck, que naquelas priscas eras apresentava, outrossim, níveis muito mais altos de masculinidade do que seus COLegas - que, no entanto, ganha foco sob o prisma pós-moderno.

O COL engendrou imitadores na esteira de seus enfoques e desfoques, uma miríade de e-zines ou mailzines que colonizaram as mentes dos nerds pioneiros. Foi o blog avant la lettre. Foi o pai, a mãe e o filho do umbiguismo cultural rampante uma década depois. Destarte o interesse ora perseguido de analisar a escrita destes formadores de opinião pubescentes. Selecionamos o primeiro texto do COLunista Marcelo Träsel, tendo em conta a indiscutível importância histórica do mesmo.

>DR. ZAPATA - O Nosso Bolchevique

No título escolhido para sua coluna o autor já apresenta o leitmotif que balizará sua obra na maior parte dos três anos de duração do Cardosonline. A vida se encaminha muitas vezes diluída nas questões da modernidade. Os parâmetros se desfazem, é difícil encontrar um norte. Questões antigas - democracia, soberania, liberdade, a afirmação dos valores de um povo - ressurgem diante das nações como o fizeram em outros tempos. A globalização a tudo confunde e exige respostas a novos e a antigos desafios. Talvez nem tão novos. Talvez os mesmos de sempre. A diferença fundamental é que a luta pela liberdade já não ocorre de dorso nu e tanguinha. Nesse contexto excruciante, um jovem universitário volta seus olhos famintos de verdade e transcendência para o comunismo. Lênin. Trótski. Emiliano Zapata. Subcomandante Marcos. Apela aos bolcheviques e aos revolucionários mexicanos.

>Dis Uêi Uálcs de Iumeniti

Transformar-se ou transmutar-se? Mais que reles semântica, a indagação está no cerne da nossa experiência mesma. No caso, o autor cita o Angeli do magazine "Chiclete com Banana" para transmutar a língua inglesa em seus mínimos múltiplos comuns fonéticos, (re)significando e assim problematizando a questão do imperialismo ianque.

>Domingo passado, como todo bom brasileiro, você também foi exercer sua
>cidadania, utilizando-se do sagrado direito ao voto que a constituição lhe
>garante. Até porque, se não aproveitasse tal direito, seria simplesmente banido
>de qualquer concurso público e impossibilitado de candidatar-se a qualquer
>cargo. Ou então, foi selecionado para colaborar com o processo democrático,
>chegando na zona (eleitoral, pessoal, eleitoral) às 8hs da matina e saindo só
>às 5hs da tarde, depois de passar o dia suando em bicas e dando à sua bunda um
>certo formato cúbico, característico de traseiros que ficam muito tempo
>sentados em cadeiras duras. Ou então, teve que agüentar a reclamação da galera
>por causa daquele velho que levou 5 minutos para votar na urna eletrônica. E,
>pior, esqueceu que o estado não fornece rango para os mesários e o babaca do
>presidente de mesa, que certamente vota no PRONA, não te deixou sair nem para
>comprar um lanchinho Dizzioli. Mas, tudo bem, nada como ser um cidadão que
>colabora com a democracia.

No microcosmo das relações familiares ou no macrocosmo das intrigas políticas, o que se dá é o enfrentamento encarniçado da célula com o organismo. A premissa original (e se eu me tornasse um mesário?) é grávida de gêmeas múltiplas. E se o funcionário se tornasse patrão? O lúmpen se tornasse aristocracia? E se o Outro se tornasse o Igual? Não surpreende que Porto Alegre, palco de tantas revoluções fracassadas, seja cenário desta fábula em que um filho da Fabico manipula uma narrativa para atingir liberdade, igualdade e fraternidade. Sem embargo, a imagem da cena eleitoral é a história de todos que buscam. Logo, de todos que sonham. Logo, de todos nós.

>Mas, afinal, que tipo de direito é esse, que o cara é obrigado a exercer? Votar
>é direito ou dever? A julgar pelas penas impostas a quem não aproveita a chance
>de escolher seu candidato, certamente um dever. Em qualquer país decente,
>inclusive nos EUA, que nossos governantes tanto gostam de copiar, o voto é
>facultativo. Quem se interessa por política, sente-se um cidadão responsável,
>deposita seu voto na urna e ajuda a definir o futuro do país. Quem tá cagando e
>andando pra isso pode ficar em casa tomando cerveja ou aproveitar o feriado na
>praia, mas sabe que vai ser governado pelos que gostam de participar. Por quê
>no meu Brasil varonil, salve! salve! não é assim? Simples: se assim não fosse,
>as pessoas mais pobres, as mais ignorantes e as que moram longe das zonas
>eleitorais não iriam votar. Ou vocês acham que um agricultor que mora no sertão
>nordestino, não sabe ler nem escrever, ganha menos de 50 pilas por mês e passa
>fome ia se interessar por eleger presidente? Geralmente eles nem fazem idéia de
>quem está ocupando o trono no palácio do planalto, e certamente não gostariam
>de sair de seu santo sossego e viajar quilômetros em caçamba de caminhão por
>estradas esburacadas só pra votar num cara cujo nome vai esquecer assim que
>deixar a urna, não fossem as sanções legais que acometem os não-votantes.
>Acontece que os coronéis e a direita precisam desses votos para se
>(re)elegerem. Portanto, acharam por bem colocar na constituição escrita na
>abertura da era Figueiredo que o voto é um direito obrigatório, só para
>garantir a transição "democrática". Afinal, depois de 20 anos de ditadura,
>podia ser que o brasileiro tivesse perdido a vontade de votar.

Se é real o sonho, não me assanho. Se o agora é utopia, não topo. Lutar pelas causas políticas é dissolver-se novamente em sua sacralidade totalizante, uma transubstanciação tão sedutora que a própria sobrevivência, ainda que acidental, é que torna-se desonrosa. Enquanto a fragilidade do humano se revela na inconformidade com as mazelas sociais e na escritura de panfletos que nunca serão fundamentais, a tenacidade sobre-humana ganha contornos palpáveis no enfrentamento dos moinhos de vento da política brasileira.

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>Vocês viram? A RBS finalmente aprendeu. Naquela eleição para prefeito em que
>Olívio, que estava dezenas de pontos abaixo de Britto até o dia D, acabou
>tornando-se nosso alcaide e o barbudo dentuço ficou em terceiro, foi difícil
>para o Sirotski e o Ibope explicarem a mudança na cabeça do eleitor.

A mídia, ávida mídia, primeiro colocou Britto sobre um palco, depois no banco dos réus e agora no leprosário. Nas rodas intelectualóides, ao menos, a suposta intelligentsia galhofa do fenômeno político, considerado o mais recente capítulo da Grande História do Charlatanismo. Mas será mesmo?

>Provavelmente, a maioria dos portoalegrenses errou ao marcar o voto na cédula,
>ou todos ouviram uma voz lhes mandando mudar de candidato na hora em que
>entraram na urna.

E a comédia, onde há de estar? Na superfície da estética bovino-periodística. Mas por detrás das ironias, hipérboles e metáforas, sob a fartura material advinda do newsbusiness, corre o arroio seco e árido do rancor das feras feridas.

>Dessa vez, Sirotski foi mais esperto: uma semana antes da eleição, Britto
>estava 15 pontos na frente de Olívio, e tudo seria decidido no primeiro turno.
>Nos últimos 7 dias, a diferença foi diminuindo ponto a ponto, até parar em
>Britto na liderança por 5 pontos. Hoje, domingo, às 10:30hs da noite, Olívio
>conta 51% dos votos e Britto 41%. Como é que vão explicar dessa vez?

Para fazer frente a tanta espetacularização hiper-real, nosso autor, epítome de uma Porto Alegre pós-eleitoral polarizada e grenalizada, precisa resgatar primeiramente a sua própria ferocidade, num processo pungente de desconstrução do sujeito e de seus referenciais, em pleno Hades cloacal. A partir daí, e com o resgate de um sentimento de uma tribalidade até então sublimada, tão bem representada pelo uso da adaga e garrucha autóctones, é que se inicia a reação.

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>Domingo, 9hs da noite. O brique acabou faz tempo, você já tomou aquela ceva na
>Oswaldo e acha que sua noite vai se resumir a assistir a finaleira do
>Fantástico e o Sai de Baixo. Esquece. Dirija-se até a Protásio Alves, 1333, e
>aproveite uma noitada de domingo no Subjazz, regada a cerveja barata (Skol,
>infelizmente, mas tb tem Budweiser), som eclético e sinuca, tudo isso na
>agradável companhia da galera da cena clubber alternativete de Porto Alegre. O
>lugar é um estúdio que abre para festas aos domingos à noite, quando geralmente
>há shows de bandas dos mais diferentes estilos. Há uma mesa de sinuca (fichas
>por R$0,50), pista e uma salinha ao fundo para aquele relax consagrado. A ceva
>de 600ml custa R$2,00 , e o público feminino é ligeiramente maior que o
>masculino.

O bar não existe. A sinuca não existe. Os clientes e a cerveja também. Não existem. De ilusão em ilusão a biografia se revela. O bar é o verdadeiro eu por trás da máscara do personagem. O buraco é o vazio de uma existência anônima e solitária numa metrópole moderna. A cerveja é aquilo que somos realmente.

>---Träsel

A obra de Träsel não é um depositário, é sim um espelho para nosso aufklärung. E ao mirar nossa alma, que reflexo vemos: a alegria ou a vergonha?

Deveras!

--- Buarque

6 de outubro de 2008, 13:48 | Comentários (7)


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