Comentários sarcásticos, crítica vitriólica e jornalismo a golpes de martelo por Marcelo Träsel


abrindo o voto

Como já é tradição neste blog, listo abaixo os candidatos que contarão com o meu voto neste primeiro turno de eleições no próximo domingo:

Prefeito - Vera Guasso, número 16
Dado o cinismo geral que tomou conta de todo o processo democrático, não é mais possível escolher um candidato com base no programa de governo. Durante mais de uma década fiz campanha para o Lula. Na eleição que o guindou à presidência, em 2002, já havia me desiludido com o petismo, mas sufraguei o nome do companheiro por curiosidade intelectual. Como previsto, o governo do PT implodiu qualquer esperança de melhorar o mundo através da política partidária.

Nesse contexto, só resta premiar de alguma forma aqueles que tornam sua vida um pouco melhor. O PSTU sempre criou os melhores slogans, como "contra burguêis, vote dezesseis", ou "contra FHC, o FMI e tudo isso que está aí". Infelizmente nunca aceitaram minha sugestão de "contra torneiro, vote maconheiro" para a eleição presidencial. Enfim, o objetivo aqui é incentivá-los a continuar participando das campanhas. No mais, até onde sei Vera Guasso é boa pessoa.

É claro, meu candidato original era o do PCO, cujo presidente regional Guilherme Giordano propôs na eleição passada o desmantelamento do "aparato repressivo da PM" e a criação de milícias populares para combater a criminalidade, mas ele desistiu de concorrer. O segundo turno a Deus pertence, vemos o que fazer após 3 de outubro.

Vereador - Professor Filipe, número 43.010
O candidato a vereador pelo Partido Verde é marido de uma de minhas tias, portanto sei ser uma pessoa honesta e comprometida com o objetivo de botar ordem no circo que se tornou o Plano Diretor da capital. Engenheiro, Filipe é um dos fundadores e professor de Física do cursinho Unificado. Participa ativamente de movimentos contrários à especulação imobiliária desenfreada em Porto Alegre. É um tema que sempre me preocupou, então voto nele não apenas por parentesco familiar, mas também intelectual.

P.S. E pensar que se eu lesse um texto como esse meu há dez anos eu classificaria o autor como um analfabeto político brechtiano, sem pestanejar. Hoje já acho que Brecht era o idiota. Sacaneou Helene Weigel e Elizabeth Hauptmann, mulher e amante. Depois de se salvar dos nazistas se refugiando nos Estados Unidos, transformou em palhaçada uma audiência do Comitê de Atividades Anti-Americanas, que, OK, também era uma palhaçada. Em vez de ficar e lutar contra isso junto a outros artistas, porém, emigrou para a Alemanha Comunista, onde desfilava em um DKW, carro de luxo na época, e mantinha cidadania austríaca e contas na Suíça enquanto o governo o usava como mito do proletariado. Apoiou a repressão a um levante popular contra a ditadura comunista pouco antes de morrer.

30 de setembro de 2008, 16:31 | Comentários (16)

usando crowdsourcing para criar massa crítica em redes sociais

A Amazon.com criou em 2006 um sistema de distribuição de trabalho chamado Turco Mecânico. Funciona assim:

  • Uma empresa precisa que determinadas tarefas simples sejam desempenhadas, mas elas necessitam de inteligência humana, não podem ser realizadas por inteligência artificial;
  • A empresa abre um pedido no Turco Mecânico detalhando a tarefa e oferecendo uma recompensa, em geral de alguns centavos;
  • Uma pessoa que esteja com algum tempinho livre aceita a tarefa e recebe a gorjeta.

    O objetivo do sistema é permitir às pessoas direcionarem seus "ciclos livres", como por exemplo a comutação de casa para o trabalho ou a fila do banco, para alguma atividade produtiva e ajudar empresas a realizar essas tarefas de que software não conseguem dar conta sozinhos. É o crowdsourcing, equivalente humano das experiências de computação distribuída como o SETI@Home.

    Sem entrar no mérito das questões trabalhistas envolvidas -- aliás, o nome deve ser muito sugestivo na Europa --, a experiência é interessante e algumas start-ups norte-americanas encontraram um uso criativo: gerar massa crítica de usuários para projetos de mídia social. A Newsbeet, "uma plataforma para a construção de seu próprio site de notícias, focado em qualquer pauta ou assunto que você queira" lançou um pedido no Turco para busca, coleta e organização de feeds RSS. Pagam US$ 1 por agregador criado, mas dividem com o responsável o lucro em publicidade contextual se ele colaborar também na geração de links remetentes àquele site.

    mechanicalturk.jpg

    Trata-se de uma interessante estratégia para conseguir o mais difícil em qualquer projeto colaborativo na Web: reunir conteúdo e usuários o suficiente para atrair mais usuários, ultrapassar a massa crítica e atingir velocidade de cruzeiro. As pessoas não entram em redes sociais mortas, elas participam das redes onde seus amigos e/ou pessoas interessantes já estão. Ninguém gosta de estar numa festa vazia, ainda que seja open bar e ofereça boa música. Obviamente, também é uma estratégia que beira o black hat e inverte o princípio de espontaneidade da mídia social. Ainda assim, a idéia de delegar essa geração de conteúdo inicial é boa e talvez possa ser colocada em prática sem as características de spam do caso do Newsbeet.

    29 de setembro de 2008, 11:26 | Comentários (4)

    blogs informativos têm de ser assinados por jornalistas, diz sindicato

    No dia 12 de agosto, o presidente do Sindicato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul, José Nunes, deu uma palestra na Unisinos sobre a questão do diploma. Segundo relatos, ele teria sugerido que a manutenção de blogs deveria ser exclusiva de jornalistas. Como bom jornalista formado que sou, enviei uma mensagem solicitando a posição oficial do Sindicato. Segue abaixo a resposta de José Nunes (grifos meus):

    O fenômeno dos blogs trouxe à tona uma eterna discussão sobre a liberdade de expressão de cada um, e os limites da atividade jornalística. Sendo o blog, em essência, um texto pessoal sobre qualquer assunto, muitas vezes a própria vida de quem escreve, ele permanece circunscrito às liberdades individuais previstas em lei. Um blog jornalístico evidentemente precisa ser assinado por um jornalista, pois passa a ter um caráter de veículo, tal como um noticiário de rádio ou mídia impressa. Ou seja, muitos profissionais passaram a se utilizar dessa ferramenta até como forma de publicar as informações que apuram, e que no local de trabalho não são aproveitadas, ou não interessam. E há quem tenha sido alçado à fama repentina dentro da possibilidade tecnológica de gerir o próprio canal de comunicação - sendo que a imensa maioria dos blogs continua como diário pessoal, postagem de fotos, links para assuntos encontrados na própria web, distribuição de arquivos diversos, com visitação restrita ao círculo de amigos. Coincidentemente, os blogs de maior destaque, uma pequena parte da blogosfera, costumam trazer apuração jornalística, 'furando' a mídia tradicional com novidade ou provocações, ou são escritos por aficcionados em determinado assunto (cinema, música, quadrinhos, etc), naturalmente trazendo um volume de informação justamente pela afinidade do autor com o tema. Material jornalístico, regularmente assinado por jornalista, independente do meio em si, é a posição do Sindicato. Concluímos então que todo os jornalistas podem ser sim um blogueiro, mas nem todo blogueiro é um jornalista.

    Se compreendi bem, portanto, conforme o Sindicato o portal Interney Blogs, que é um veículo de informação, deveria ter todo conteúdo produzido apenas por jornalistas. A Nova Corja deveria expulsar o colaborador Walter Valdevino, que é filósofo, não jornalista. Ou o Merigo teria de contratar um jornalista reponsável para continuar tocando sua revista eletrônica especializada em Publicidade, o Brainstorm #9. Num espírito mais condescendente, poderia imaginar que o Sindicato na verdade está se referindo aos blogs mantidos por não-jornalistas dentro de portais pertencentes a empresas jornalísticas, caso em que de fato existe uma zona cinzenta e espaço para discussão.

    Considero a posição lamentável, por pretender colonizar um campo de atividade que, embora se assemelhe ao jornalismo, é diferente. Blogs podem ser informativos, mas não detém o mesmo status da imprensa. Blogs não pretendem ser a palavra final sobre um determinado assunto, mas apenas um grão de areia em uma discussão geral na Web -- o que não impede um blogueiro de, eventualmente, dar a palavra final sobre determinado fato. O público não forma uma opinião lendo apenas um texto em um blog, mas analisando vários textos disponíveis na blogosfera, participando de discussões nos espaços para comentários, acompanhando por longos períodos de tempo determinados autores, até confiarem que eles são honestos.

    (OK, existe gente que acredita em tudo que lê na Internet, mas esses também não usam o senso crítico ao ler jornais e portanto estão perdidos para a democracia.)

    Por outro lado, o próprio Sindicato admite que a informação produzida por alguns blogs excede em qualidade a produzida por jornalistas. Se algumas áreas estão desatendidas pela imprensa profissional a ponto de serem ocupadas por leigos em jornalismo, não seria por falta de interesse econômico? Nesse caso, a solução melhor não seria deixar que os próprios jornalistas tomem conta desses espaços usando sua qualificação profissional para oferecer ao público informação melhor, em vez de se propor uma reserva de mercado?

    Finalmente e mais problemático: os pesquisadores da área estão tentando desde o surgimento dos blogs determinar a linha que divide o jornalismo da simples produção de informação. Até hoje, ninguém conseguiu fazer isso de maneira indiscutível, porque esse tipo de veículo costuma misturar formatos em graus que variam de blog para blog. No caso de se aplicar essa proposta, quem vai definir quais blogs tem caráter jornalístico, quais fazem jornalismo "às vezes" e quais não devem nada ao Sindicato?

    A Internet foi arquitetada para evitar o controle centralizado, então qualquer legislação no sentido de cercear os blogs informativos será pouco mais que gasolina para começar flame wars com direito a muito Google bombing.

    23 de setembro de 2008, 18:36 | Comentários (30)

    21º SET universitário

    Meus alunos no estágio de Jornalismo Online estão cobrindo ao vivo o 21º SET Universitário da Famecos/PUCRS. O streaming de vídeo e o minuto-a-minuto via Twitter podem ser acompanhados nesta página.

    Hoje às 19h30 acontece o RBS debates com, entre outros, Ricardo Noblat.

    Amanhã às 9h a Ana Brambilla fala sobre webjornalismo participativo.

    22 de setembro de 2008, 18:08 | Comentários (0)

    meu comentário sobre o bailão

    21 de setembro de 2008, 17:24 | Comentários (8)

    bailão centenário do cardosonline

    Amanhã acontece em Porto Alegre o Bailão em comemoração aos dez anos do Cardosonline. Apareçam e revejam seus COLunistas favoritos, dancem ao som de sucessos dos anos 1990 e participem da fantástica competição de cabelos brancos -- quem tiver mais, ganha um frasco de Denorex.

    O QUÊ: Bailão Centenário do Cardosonline
    ONDE: Ooh La La - Oswaldo Aranha, 908
    QUANDO: 19 de setembro, a partir das 23h
    QUANTO: R$ 10

    Foi publicada ontem também uma matéria no caderno de informática da Folha de São Paulo sobre os dez anos do Cardosonline -- para ver, clique no "leia mais" ao final deste texto. Como há pouco espaço no jornalismo impresso, achei interessante colocar todas as minhas respostas a seguir:

    > * Como vocês "inventaram a internet"?

    Com a ajuda inestimável dos professores da UFRGS, que fizeram a gentileza de entrar em greve mais ou menos ao mesmo tempo que a Internet comercial no Brasil engatinhava. Sendo jovens desocupados e vanguardistas, resolvemos dar vazão à nossa prepotência usando aquele incrível meio de comunicação que permitia enviar egotrips para o mundo inteiro sem a necessidade de tirar centenas de fotocópias, grampeá-las no formato de fanzine uma a uma e enviar pelo correio.

    > * Como você enxerga o rótulo de "escritor de internet, surgido de blog"? Em
    > quase todas as matérias que falam de escritores que usam a internet para
    > escrever, o COL é citado como uma espécie de precursor...

    Acho ridículo. Ainda bem que não sou escritor. Tenho pena da Clara, do Pellizzari, do Galera e do Cardoso.

    > * Dez anos depois, como você vê a importância do COL para a internet?

    Essencial, já que as duas coisas estão inextricavelmente ligadas.

    > * Existiria espaço para algo semelhante ao COL hoje?

    Praticamente toda a Internet hoje é algo semelhante ao COL, apenas em outro formato. Conforme o Technorati, cria-se um blog a cada segundo. Isso significa um COL a cada segundo. E não estou nem contabilizando o conteúdo produzido em redes sociais. Diria que o formato misturando egotrip e diletantismo desenfreado é hegemônico na Web, e não apenas a brasileira. O que é na verdade uma coisa triste. Muita gente boa achou que a Internet seria um grande avanço para o debate democrático, uma nova Atenas. Sinto-me responsável pelo fato de hoje a Internet parecer mais um cabaré parisiense do século XVIII.

    > * O que você fazia no começo do COL e o que faz agora?

    Tinha acabado de trocar o curso de Farmácia pelo de Jornalismo e estava dedicando grandes esforços a uma pesquisa empírica sobre a resistência do fígado humano ao etanol. Também estava dando os primeiros passos na carreira científica como bolsista em um núcleo de estudos em mídia na UFRGS. Hoje sou professor de Comunicação Digital na PUCRS, consultor em novas mídias e mantenho três blogs: o Martelada (www.insanus.org/martelada), pessoal, o Garfada (www.insanus.org/garfada), sobre gastronomia, e o Conversas Furtadas (www.insanus.org/conversas), que reúne fragmentos de diálogos entreouvidos nas ruas.

    > * Vocês pensam em se reunir de novo, pra valer?

    Não. Tenho a firme convicção de que a maior felicidade da vida é saber o momento exato de encerrar um ciclo e deixá-lo para sempre cristalizado como uma memória boa. Aí está um patrimônio inestimável na velhice -- ao menos até a esclerose atacar.

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    18 de setembro de 2008, 15:13 | Comentários (5)

    PT é o primeiro partido a usar a lei azeredo

    Para quem acha que a Lei Azeredo é uma invenção e projeto de tucanos direitistas e reacionários, vale a pena ler o post do Imprensa Marrom a respeito do assunto. De posse da decisão liminar, Gravataí Merengue descobriu que toda a argumentação para retirar o Twitter Brasil -- opa! -- o perfil falso no Twitter da candidata à prefeitura de Fortaleza Luizianne Lins foi baseada na Lei Azeredo. Não surpreende, já que a redação final foi dada pelo senador petista Aloízio Mercadante.

    Os nomes dos advogados ignorantes que não sabem diferenciar um serviço de rede social/microblog de um blog independente são: José Aroldo Cavalcante Mota, Isabel Cristina Silvestre de Mota, Rodrigo Cavalcante Dias, Lúcio de Melo Freitas e Erlon Albuquerque de Oliveira. A seguir, os melhores trechos:

    Alegam que a primeira postulante (coligação) tomou conhecimento da existência de um falso perfil em nome da candidata Luizianne Lins "em site de relacionamento divulgando absurdos e iludindo as pessoas que acessam o endereço eletrônico" , denegrindo a sua imagem e deturpando "seu conceito perante a opinião pública" .

    Disse, ainda, que tal site - Twitter, ¿é uma iniciativa estrangeira" , mas, possui escritório no Brasil "hospedado no domínio http://twitterbrasil.org/".

    Aí em cima a prova de que realmente foi culpa da equipe de Luizianne Lins, não do TRE-CE, a barbeiragem de retirar o blog do ar em lugar do perfil falso no Twitter.

    Por fim, requereu a concessão de provimento liminar, a fim de determinar, incontinenti, a cessação da veiculação apontada e a intimação do site responsável pela hospedagem "para que a TWITTER retire o microblog falso/fake de Luizianne Lins, bem como no sentido de promover a identificação do responsável pela conduta transgressora" , assim como que seja fornecida "a relação de IPs utilizados na alimentação do microblog por parte de seu criado, bem como os utilizados no cadastro de criação do mesmo, dados os quais deverão estar disponíveis em arquivos LOG ou salvaguarda semelhante" , tendo protestado, ainda pela intimação do MP e a procedência da representação com a confirmação da liminar e a "condenação dos responsáveis pela veiculação fraudulenta" .

    Em todo caso, é preciso reconhecer que os advogados solicitaram apenas a retirada do perfil falso e a identificação do criador do mesmo, o que é bastante justo, ainda que contraproducente do ponto de vista do marketing, por ignorar o Efeito Streisand. Parece que, neste caso, foi o provedor de hospedagem do Twitter Brasil que, apavorado com a multa por descumprimento de R$ 50 mil por dia e provavelmente tão ignorante quanto a equipe de Luizianne, retirou do ar o blog sem nem mesmo se dar conta de que a petição errou de alvo. Ou seja, pelo jeito a prática dos provedores é arriar primeiro e perguntar depois.

    O interessante, em todo caso, é que os termos usados na argumentação, como "log ou salvaguarda semelhante", parecem ter sido retirados do PLC 89/2003, que ainda nem foi aprovado. O autoritarismo petista deve estar esfregando as mãos de ansiedade para iniciar uma chuva de processos assim que essa lei for aprovada. Isto é, se o for. Ainda há espaço para combater a aprovação dos artigos mais despóticos e ridículos do projeto.

    Quanto à Luizianne Lins, se permite uma barbeiragem dessas por conta de sua equipe em plena campanha eleitoral, imaginem governando o que não deixa passar.

    15 de setembro de 2008, 12:25 | Comentários (8)

    íntegra do artigo sobre o #rodaviva e o twitter

    O artigo foi aceito para apresentação no próximo encontro da SBPJor, na Universidade Metodista de São Bernardo do Campo, ABC Paulista. Com prometido, quem quiser ler na íntegra pode baixá-lo aqui:

    O uso do microblog como ferramenta de interação da imprensa televisiva com o público

    Estarei lá discutindo esse artigo entre os dias 19 e 21 de novembro com a Gabriela Zago, do Twitter Brasil, que apresenta o trabalho O Twitter como suporte para produção e difusão de conteúdos jornalísticos. Por favor, façam observações e correções aí embaixo no espaço de comentários.

    11 de setembro de 2008, 17:42 | Comentários (1)

    ...

    9 de setembro de 2008, 20:46 | Comentários (2)

    finalmente chego à idade que sempre tive

    Como o pessoal lá do CERN resolveu adiar a ativação do Large Hadron Collider para o dia 10 de setembro, garantindo que eu chegasse aos 30 anos hoje, sinto-me obrigado a agradecer escrevendo algo a respeito.

    Costumo brincar que já nasci com 30 anos, porque sempre fui uma criança e um adolescente um pouco mais maduro do que meus companheiros de faixa etária. Ou sempre fui chato. Como preferirem. No entanto, preciso reconhecer que a idade muda um pouco o espírito do homem. E para melhor -- ainda bem, já que o corpo só piora após os 25 anos.

    Nunca fui tão tranqüilo e feliz. A experiência permite relativizar os acontecimentos, contrapô-los a eventos passados e ao que se passa ou passou com outras pessoas, e nesses casos você em geral percebe a inutilidade de se preocupar demais. Aos 30 anos já dá para perceber que você não vai mudar o mundo e na verdade não faz diferença alguma no plano geral das coisas, então fica mais fácil relaxar e aproveitar as alegrias da vida. São muitas. A maioria delas, simples, como ter um bom café para tomar pela manhã, dedicar-se a uma arte marcial ou ter um emprego intelectualmente estimulante.

    Sinto-me uma pessoa melhor em vários sentidos. Sou hoje menos agressivo, tenho menos certeza das coisas, tenho mais empatia pelas pessoas -- como ter empatia quando se é jovem e nunca se sofreu de verdade? O grupo de amigos e conhecidos se reduziu, mas em compensação tenho mais apreço por cada um dos meus relacionamentos. Já fiz de tudo, então me satisfaço muito mais ficando em casa com minha mulher, "sem fazer nada", do que caindo na esbórnia como quando era mais jovem. Na verdade, poucas coisas me dão mais aversão hoje do que me enfiar num lugar quente, escuro, enfumaçado, com som alto e gente bêbada numa noite de fim de semana.

    Aliás, estou vivendo com uma mulher a quem amo incondicionalmente, possibilidade que há cinco anos considerava uma piada melancólica, dada a perturbação espiritual que me acometia. Hoje tenho certeza do rumo que minha vida tomou, e vocês não imaginam a paz gerada simplesmente por saber aonde se quer chegar. E pelo certeza de onde se vai parar, no fim: a sete palmos de fundura, comendo capim pela raiz.

    A idéia para esse texto surgiu quando percebi, fascinado, que não sentia mais a necessidade de ter opinião sobre as coisas. Os leitores que me acompanham há mais tempo devem se lembrar do quanto eu parecia gostar de me envolver em qualquer discussão, sobre qualquer tema, como se dela dependesse o futuro da humanidade. Hoje, não mais. Quem tem razão, Israel ou Palestina? Não sei, nem quero saber. Eles que se preocupem com isso. O MST tem ou não razão ao invadir terras? Sei lá. Não sou dono de terras, nem quero ser. Cigarros? Desde que não fumem perto de mim, os outros podem se matar à vontade. Enfim, estou aprendendo a só falar de coisas que conheço. Ao me dar conta disso, comecei a analisar essas outras mudanças pelas quais tenho passado.

    Acreditem: envelhecer é trimassa.

    No entanto, percebo que a sociedade em geral não compartilha desse sentimento. Cada vez mais tratam os velhos por "melhor idade", ou "jovens de espírito acima de 65 anos", como nos ônibus de Porto Alegre. Acho essa negação da morte nada menos do que deprimente. Tenho um grande pavor de chegar aos 60 anos em contexto onde tenha de me esforçar para parecer jovem e não possa gozar dos privilégios da idade, como ser tratado por "senhor", dizer "não" sem dar maiores explicações e agir como criança sem ser considerado um imbecil, mas apenas senil. Para combater essa imbecilidade geral, criei o projeto DignIDADE. Melhor idade é o caralho! Dignidade DJÁ!

    Até porque parece que as chances de o LHC destruir o mundo são milhares e milhares de vezes menores do que as de uma pessoa evaporar de súbito enquanto se barbeia, então provavelmente passarei dos 30 anos.

    6 de setembro de 2008, 16:27 | Comentários (23)

    proposta indecente da abril blogs

    Anteontem recebi da equipe da Abril Blogs um convite para me juntar à "área VIP" do serviço. Pedi mais detalhes e a resposta segue abaixo (grifos meus):

    Oi, Marcelo. Tudo bem?

    Basicamente, é o seguinte: estamos montando um ambiente onde os blogueiros e fotógrafos mais relevantes do país possam ter um espaço maior para expor as suas opiniões e visões de mundo. Como a Aline comentou, essa seleção será feita pelo próprio usuário – mas começa conosco, aqui no I-Group.

    Como parte desse time da Abril Digital (batizado de Área VIP), os blogueiros terão acesso prático a informação em primeira mão (perdoe a rima), audiência (via destaques periódicos na home da Abril), workshops gratuitos com especialistas, promoções específicas apenas para esse time e assim por diante. Se quiser, tem mais informação no http://blogs.abril.com.br/areavip

    Para fazer parte, você precisará transferir o seu blog para o ambiente da Abril Digital. E, para tanto, basta "criar" um blog no http://blogs.abril.com.br (algo como blogs.abril.com.br/seublog ) e começar a postar. Esse será o endereço que divulgaremos nos ambientes da Abril Digital e pelo qual você terá acesso aos benefícios.

    Te peço também que você me envie um email tão logo crie o blog novo. Convidamos, inicialmente, um número extremamente seleto de blogueiros – e o controle que estamos fazendo aqui está bem rígido sobre quem recebe e quem não recebe o acesso à área VIP.

    Alem disso, estamos estruturando um evento de apresentação dos blogueiros VIP (dentre os quais, esperamos, você) para a imprensa. Será um coquetel na noite do dia 1 de outubro, no prédio da Abril (aqui em SP).

    Essas são apenas as primeiras das ações que faremos com os membros desse time. Se tem uma coisa que podemos garantir é que, caso você decida fazer parte desse grupo, certamente não se arrependerá. ;-)

    Bom.... estou deixando os meus contatos abaixo, caso você queira esclarecer qualquer ponto. Podemos contar contigo?

    Tenho uma proposta muito melhor: a Abril me paga honorários de consultor e eu ajudo esse projeto a não fracassar miseravelmente. Algumas dicas:

    Solicitar a transferência de um blog demonstra total desconhecimento da blogosfera e da própria Web. O projeto visa trazer autores de qualidade e conhecidos para a Abril Blogs, que emprestarão sua credibilidade e darão um pontapé inicial na audiência. O problema é que esses blogueiros são os menos interessados em fazer qualquer parceria. Eles andam sobre as próprias pernas há meses ou anos. Provavelmente já ganham dinheiro com anúncios e programas de filiação. Por que se mudariam para uma hospedagem nos servidores da Abril, perdendo esse faturamento? Não faz sentido algum.

    A Abril Blogs não sabe com quem está falando. Literalmente. O assunto da primeira mensagem de correio eletrônico era "sobre o seu blog". Completamente genérico. O texto era padrão, em momento algum citava o nome do blog ou os assuntos abordados. Isso provavelmente explica o fato de terem oferecido a um jornalista a possibilidade de escrever de graça para uma editora, sendo que para isso ainda teria o trabalho de mudar meu blog para o ambiente deles. Também saberiam que resido em Porto Alegre e, portanto, o evento em São Paulo não tem qualquer apelo -- e nem ofereceram uma passagem e estadia.

    Os benefícios são vagos e não-contabilizáveis. A Abril quer que as pessoas fechem seus blogs atuais e abram novos apenas para assistir a workshops e ter "informação em primeira mão". Bem, se um blogueiro é considerado importante, provavelmente ele já sabe como conseguir informação em primeira mão, ou a recebe diretamente das fontes. E o que seria essa informação? Documentos aos quais apenas os repórteres da Veja tiveram acesso? Relatórios de escutas telefônicas? Ou poder ler antes da publicação alguma idiotice requentada da Boa Forma? Porque, francamente, até o blogueiro mais lamer sabe que pode ler tudo o que sai na imprensa nacional bem antes e em outras línguas, navegando na Web. Blogs são, afinal, veículos de filtragem da Web. E esses workshops, quem serão os ministrantes? Fernando Henrique Cardoso? Diogo Mainardi? Ou, com todo respeito, algum repórter semidesconhecido da editora? Tampouco se sabe quantos serão os workshops e a quanta informação o blogueiro terá direito. Enfim, é bem claro que o sujeito tem de fazer concessões importantes, mas nada claro o que receberá em troca.

    Os templates são ruins. E a pessoa nem pode mudar e configurar da forma que quiser, ou instalar plugins e widgets.

    Finalmente, mas não menos importante, participar desse projeto é trabalhar de graça para a Abril, como se pode verificar nos Termos de Serviço. Observe-se esses dois trechos:

    9. Publicidade nos blogs

    O Usuário concorda que a Abril pode publicar banners e/ou anúncios publicitários nos blogs que utilizam sua ferramenta de publicação.

    Esses anúncios podem ser da Abril, dos produtos e serviços da Empresa, ou ainda de qualquer terceiro a quem a Abril tenha cedido espaço publicitário, a seu exclusivo critério.

    10. Direitos autorais

    [...]

    A Abril é proprietária de todas as compilações, trabalhos coletivos ou derivados criados pela Empresa, e que podem, eventualmente, incorporar o conteúdo dos blogs criados pelos Usuários.

    O Usuário concede licença de uso irrevogável, perpétua, global e livre de royalty para uso, exposição pública, publicação, exibição pública, reprodução, distribuição, transmissão, adaptação, alteração e promoção de seu conteúdo publicado nos blogs em qualquer mídia da Abril.

    Ou seja, a editora pode se aproveitar do conteúdo criado pelo usuário para veicular publicidade e auferir lucro dessa atividade e, ainda, detém os direitos de uso de todo o material criado pelos blogueiros, sem pagar um centavo por eles. Para que contratar jornalistas e outros profissionais para produzir conteúdo, quando os indivíduos conectados em rede estão aí para serem explorad... -- perdão! -- crowdsourceados?

    4 de setembro de 2008, 16:00 | Comentários (128)

    all your base are belong to us

    bailao_centenario_p3.jpg

    3 de setembro de 2008, 17:33 | Comentários (2)


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