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fonemas.
As interpretações lingüísticas dos meus alunos de francês são, no mínimo, graciosas. Gateau, por exemplo, que nada tem a ver com o bicho, parece para uma garota um gato oxítono. Gatô. Froid (leia-se algo perto de frruá e quer dizer frio) para outra virou Freud. O dotô. E o amigo que logo vai embora, hoje achou graça de existir uma cidade na França chamada Tours. Riu bastante e depois disse: é Torres.

postado por Carol Bensimon as 20:48 | pitacos (7) | trackBack (0)

não mostrar.
Num filme meio lado B do Hitchcock (cujo nome não achei agora) tem essa cena que diz muito sobre as belezas e peripécias do "não mostrar" em uma narrativa. O assassino do filme é o focalizador, portanto o acompanhamos desde o início nos crimes e nos desdobres que ele dá na polícia, ou ao menos assim eu me lembro, porque já faz um tempinho. Bem, acontece que num determinado ponto sabemos que ele vai matar fulana: vai ir até o prédio, vai subir, abrir a porta, vai pegar a sua gravata e entrangular a mulher. E realmente o enxergamos indo e depois entrando no prédio. E aí vem a genialidade do Hitchcock. Ao invés de entrarmos no escritório com o assassino e assistirmos à morte da mulher, Hitchcock se limita a deixar a câmera parada na entrada do prédio durante toda a ação. Portanto fica aquela imagem quase fotográfica ali, a tensão do espectador já engasgando. Aí depois de um tempinho ouvimos o grito da vítima e depois vemos o sujeito ir embora. Mestre absoluto.
Mas lembrei de comentar isso porque estava lendo "A Ilustre Casa de Ramirez" (Eça de Queiroz) para a prova do mestrado e percebi que Eça usa o mesmo truque. Lá pela metade do livro, já antecipamos uma ação das mais importantes. O protagonista, Ramirez do título, vai engolir antigas mágoas e ódios que tem com o tal Cavalleiro porque quer uma vaguinha na câmara, e só esse velho inimigo pode nomeá-lo para tal. Bem, sabemos disso e sabemos que Ramirez decidiu conversar com o Cavalleiro. Sabemos que ele está indo para a câmara com esse intuito e sabemos o quanto vai tenso e envergonhado com o fato, além de estar tentando planejar incansavelmente a maneira menos humilhante de conseguir o que quer. Quando ele entra na câmara, como em Hitchcock, ficamos de fora, nervosos e ansiosos como os cidadãos que se juntam na praça de frente ao prédio para saciar também a sua curiosidade. É através das especualações dessas pessoas e da sua visão limitada que vamos seguindo a ação. Por exemplo quando Ramirez e Cavalleiro saem na sacada, se apertam as mãos e etc.

postado por Carol Bensimon as 19:47 | pitacos (2) | trackBack (0)

armazenamento de cheiros.
Uma coisa que eu gostaria de comprar daqui a uns cinco anos é um gravador de cheiros. Aperte REC e capture o cheiro pro resto da vida. Ah, fala sério que tu achou a idéia estúpida. Não é não. Acho o olfato um troço admirável. Basta sentir um cheiro no presente e conectar com um do passado para uma história IMENSA ser reavivada na mente, de um jeito dez vezes mais potente do que com alguma semelhança visual, por exemplo. E levar um troço desses na viagem, nossa. Cheiro do metrô de Paris. Cheiro de pain au chocolat. Cheiro de gelo seco em reunião dançante. Cheiro dos Piratas do Caribe do Walt Disney World (o mesmo que tem o elevador de cargas do Hospital Moinhos de Vento).
Sou viciada em cheiros. Não provo nada sem sentir o cheiro, aliás. Sobretudo com bebidas. E pro prazer de comer chocolate ser maior (principalmente com as trufas do Max ou qualquer coisa mais FINA), convém antes dar uma cheiradinha para incrementar a coisa toda.

postado por Carol Bensimon as 14:53 | pitacos (7) | trackBack (0)

simon evans.
No blog dele, Zani disse tudo que sentimos, mas que eu não conseguiria dizer, lá na Bienal com as obras do tal Simon Evans. Vai.

postado por Carol Bensimon as 15:10 | pitacos (3) | trackBack (0)

isso nisso
Três horas na frente do computador transformam


Isso

As meninas estavam sentadas nos degraus da venda. Corria uma estrada ali na frente, naquela altura larga, que depois afinava para subir a serra em espiral. Ficavam olhando os carros e o calor e só. A venda era em casa de mil novecentos e trinta e poucos, que estalava como uma senhora de ossos fracos. Nas paredes tinham pendurado cartazes de refrigerante, com jovens bebendo pela metade da boca e sorrindo pela outra metade. Paravam ali aqueles que não iam ficar e logo se iam embora outra vez. As meninas ficavam reparando, cochichavam e queriam ir junto. Uma era loira de pernas finas e bem compridas, com picadas de mosquito e casquinhas de sangue de tanto coçar. A camiseta ia até as coxas, se coxas já tivesse, com um desenho dum sol, uma palmeira e um Miami. A outra, também de cabelos claros, com uma pedra riscava um degrau na entrada da venda. Essa era a irmã mais velha, que não mostrava perna nem nada, pois alguma coisa já começava a ter, e só a pulseira com umas bolas amarelas quebrava o preto da roupa. A de onze era a Titi e a de quatorze, a Lina.


Nisso

Acontece que nasceram numa cidade bem pequena entre duas mais ou menos grandes, um tipo de coisa ruim para o conformar-se, porque assim tinham toda a estrada pra olhar, e olhavam. E acontece que na beira da estrada havia uma venda em casa de mil novecentos e trinta e poucos, seus degraus uma arquibancada para as meninas. Ficavam, e toda a tarde. Uns carros passando, um carro parava. Titi deixava que as pernas finas se esticassem na passagem, com picadas de mosquito em casquinhas de sangue de tanto coçar. A camiseta ia até as coxas, se coxas já tivesse. O viajante pedia licença, entrava, Titi ria escondido. Lina, mais velha em três anos, era um tanto mais triste. Não mostrava perna nem nada, pois alguma coisa já começava a ter. Riscava o nome com uma pedra, só a pulseira com bolinhas amarelas quebrava o preto da roupa. O viajante outra vez ia embora com a coca-cola. Se vinham famílias, tanto melhor, a venda estalava como uma senhora. Dona Celestina fazia as somas a lápis na letra demorada de colégio. O viajante se impacientava porque tinha que viajar. E dentro da venda os velhos jogavam dominó sem falar nada.


O primeiro é o velho (isso que já era a terceira ou quarta versão) primeiro parágrafo de um conto que estou escrevendo, o segundo é o novo.
Ó, se eu pudesse, passava o dia só batendo papo nesses assuntos de processo, que é lindo, bicho. Ver a coisa tomar outra forma por paciência e intuição (que é palavra para dizer "técnica assimilada", acredito) até o jeito que a gente quer (pelo menos até o jeito que a gente quer NO MOMENTO) dá um arrepio bom, um espanto literário. Talvez passe um dia, tomara que não. Que delícia seria ir pro parque e ficar fazendo autópsia de texto em grupo.

postado por Carol Bensimon as 23:48 | pitacos (8) | trackBack (0)

bensinhaaaa.
Cheguei. Cabeça dura pra caralho. Passou a sede constante da poluição. Lá foi beleza pelas gentes, comidas e artê. Comi simulando a França: croque de chèvre num bistrozinho, pain au chocolat duas vezes na Bienal. Eu e A. tivemos as intermináveis conversas sobre como se colocar no mundo. Eu e Z. tivemos as intermináveis conversas artísticas teóricas. B. estava na habitual forma malandro carioca me chamando de "bensinha" no meio das gritarias. "A fila sem fim dos demônios descontentes" tá delícia. Conheci dois garotos muitos simpáticos e fiquei com o guarda-chuva de um. Eu e um bando nos agarramos num porco de bronze que parecia estar sendo currado em pleno Ibirapuera. Ah, e tentamos burlar um controlador de velocidade pulando todos juntos em cima dos sensores. Não marcou droga nenhuma. Marquei um karaokê hypado e não fui.
Tô aqui em Porto bem mais agitada que o normal. Mudei um pouco de opinião sobre o Erico Verissimo, porque percebi que analisar qualquer coisa sem levar em conta a propóshta era besteira. Falaremos mais sobre isso, se quiserem. Por enquanto ainda estou chocada, porque abri a segunda parte e encontrei uma carta sem assinatura. Meiga, coisa linda, de quem perde os critérios pelo encantamento. Me desmanchei, não sei quem foi que gostou de mim.

postado por Carol Bensimon as 17:35 | pitacos (16) | trackBack (0)

pô, eu não sei não!
Com o perdão pelo provincianismo, que alguns assim vão classificar, mas que desconforto é pedir informações aqui em São Paulo e descobrir que ninguém conhece a cidade onde vive. Sim, eu sei que é grande demais e portanto impossível entender de todo o lugar. Mas, por Deus, estávamos a duas quadras do Mercado Municipal e ninguém parecia saber do que se tratava, quanto mais apontar direções. Edifício Martinelli, ahn, do que cê tá falando? Nem em que estação de metrô descer pra chegar na Augusta eu descobri de primeira. O tipo da sensação que me seria desagradável, não conhecer o meu próprio lugar. Perda completa do controle. A cidade não é de ninguém.

postado por Carol Bensimon as 19:06 | pitacos (23) | trackBack (0)

são paulo.
Estou indo para São Paulo, volto na terça. Sempre me impressiono com a quantidade de coisas que precisamos levar, por menor que seja a viagem. Dizem que é porque sou mulher, mas aposto que não tem nada de supérfluo em toda aquela mala. Dá pra dizer que só o chimarrão.

postado por Carol Bensimon as 10:17 | pitacos (7) | trackBack (0)

correio elegante.
Se alguma garota chamada Tábata com acento e adesivo do Olívio na bolsa chegar até aqui, bem, é porque precisa mandar um mail para carolbensimon@terra.com.br. Merci beaucoup.

postado por Carol Bensimon as 23:05 | pitacos (0) | trackBack (0)

morte precoce.
Nós todos devemos ter respeito pelo Erico Verissimo, eu sei (alguns já foram demitidos por não seguir o mandamento). Tu leu O Continente no colégio e achou bem massa, eu também. Mas eu estou lendo agora para a seleção do mestrado e sabe qual a fase de abertura dessa gigantesca trilogia d'O Tempo e o Vento? Veja bem que falo de primeira frase, e acredito que sobretudo os que escrevem sabem o quanto isso é importante. Pois a primeira frase é:

Era uma noite fria de lua cheia.

Infarto fulminante ao ler isso.

(Comentando com um amigo, descobri que existe um concurso de piores começos de livro. Chama-se o prêmio: It was a dark and stormy night. Quase Erico. Alguém já ouviu falar desse negócio? Mojo?)

postado por Carol Bensimon as 23:26 | pitacos (14) | trackBack (0)

contos de bolsa.
Amanhã tem lançamento do Contos de Bolsa, coletânea de minicontos de temática mulherzinha. Organizado pela Laís Chaffe e publicado pela Casa Verde, estou eu lá com a Cíntia Moscovich, Luiz Paulo Faccioli, Paulo Scott, Eduardo Nasi, Fabrício Carpinejar, Carlos Gerbase e muitos outros.
O gathering será no Dado Bier, terça (3 de outubro), a partir das 19h30, e parece que rola também um show com os poETs e banda. Chega lá.

postado por Carol Bensimon as 12:16 | pitacos (3) | trackBack (0)

neurose pós-moderna.
É, nós últimos dias, fui completamente desfragmentada pelo espaço virtual: se separou a cabeça do corpo e o corpo da cabeça. Enquanto a parte-cabeça continuou a da discreta, tímida e recatada Carol Bensimon, a parte-corpo foi vista por aí sem que se associasse uma coisa a outra. Atribuiu-se a essa última uma identidade INDETERMINADA, porque, bem, as pessoas simplesmente não podiam acreditar etc e tal. Achei tudo muito engraçado, embora confesso ter me sentido um pouco ofendida pela descrença até dos mais próximos (mas não tão próximos a ponto de conhecerem as INTIMIDADES), a Carol é gostosa? Não pode ser.

postado por Carol Bensimon as 09:21 | pitacos (16) | trackBack (0)

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insanus



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